domingo, 12 de maio de 2013

BEM CASADOS!



A Cia. Falácia (RJ) trouxe dois espetáculos ao Palco Giratório, Amor Confesso, com contos de Artur de Azevedo, e A Nova Ordem das Coisas, inspirado no texto ‘A Igreja do Diabo’, de Machado de Assis.Na quinta-feira (09/05), tradicional dia de Bulixo no SESC Arsenal, assistimos ao Amor Confesso dos atores Claudia Ventura e Alexandre Dantas. Uma hilariante comédia que brincava com o casamento se utilizando de contos de Arthur Azevedo. Coincidência boa este espetáculo ser apresentado bem no dia em que as famílias cuiabanas lotam as varandas do SESC, pois a brincadeira era justamente: casar ou não casar? Os atores, casados na vida real, utilizam suas experiências pessoais para pensar, com a ajuda da plateia, se continuam juntos e realizam a cerimônia do casamento depois da peça, ou se é melhor deixar pra lá esse negócio de casamento, que só dá errado. Com a leveza peculiar à comédia carioca, Claudia e Alexandre conversam com a plateia, brigam, discutem sua relação e investigam seu casamento contando as histórias de Arthur Azevedo, uma após a outra, carregadas de traições e desacertos. Para manter a montagem em consonância com sua fonte, os atores mantém a linguagem utilizada nos contos, de um português rebuscado e arcaico com expressões típicas da época, e ainda brincam com vários sotaques em referência à população carioca do período, que advinha de todo canto do Brasil e do mundo.  De acordo com a história de vida do casal, Arthur Azevedo é considerado ‘padrinho’ de casamento dos atores, pois foi em um ensaio de uma peça dele que o casal iniciou o namoro. Nada mais justo, portanto, que seja em uma peça do mesmo autor que devam iniciar o casamento! Seria uma empreitada mais simples não fosse o teor dos contos do autor, que só falam de traição e não tem final feliz. Com as risadas incentivadoras da plateia, o casal supera os contos e reafirmam seu casamento, como já era de se esperar. Novamente vemos o jogo de ‘leva e trás’ entre a ficção e a realidade, bem típica do teatro contemporâneo, e no caso desta montagem, com uma camada a mais: um modo de atuação que se relaciona com o formato defendido pelo autor dos contos. Além de divertida, os atores utilizam uma interpretação inspirada no teatro de revista, consolidado por Arthur Azevedo no final do século XIX e início do XX; a fala rápida e naturalista, a triangulação com a plateia (falo olhando para a plateia e depois olho para quem me ouviu, e vice e versa e versa e vice), o tom cômico e alto e os temas fáceis e marcações que reforçam o discurso.  Este gênero se utilizava da comédia de costumes como referência textual, dramaturgia que Arthur Azevedo era mestre, e se concentrava na cultura urbana carioca, seus costumes e seu cotidiano, desenvolvendo uma modalidade jornalística que servia para colocar a cidade à par dos eventos sociais. O escritor sustentou sua numerosa família vivendo da comédia e qualquer semelhança com o stand-up atual, não é mera coincidência. Mas, vale dizer que o espetáculo que vimos não pertence ao gênero stand-up, apesar de semelhante; a Cia. Falácia apresenta uma pesquisa cênica a partir dos contos de Arthur Azevedo, que consolidou a comédia de costumes, que por sua vez inspirou a comédia atual.   O ótimo jogo entre os atores e suas interações com a plateia são o ponto alto do espetáculo. De maneira fluídica e rápida, os atores transformam as informações dadas pelos espectadores em texto e neste jogo dão aula de improviso e comédia. A química entre os atores é nítida e fica muito claro que este casamento deu certo. Ao menos, no palco!  A diretora Inez Viana conseguiu criar um paralelo simples e eficiente entre o casal e os personagens. É bem verdade que o número de contos poderia ser menor, mas talvez o amor ao padrinho os proíba tal corte.  Na cenografia, duas cadeiras tão brilhantemente utilizadas pelos atores que tornou desnecessária o fraque e o vestido de noiva que tomavam as laterais do palco. A participação do músico Roberto Bahal mostrou que músico também sabe atuar, e ator também sabe cantar. Um brinde ao riso e vida longa à Arthur Azevedo!

Juliana Capilé e Tatiana Horevicht
CIA PESSOAL DE TEATRO