O espetáculo Pereira da Tia Miséria
encantou o público presente no jardim do SESC Arsenal, numa noite fria de sexta
feira (17/05). A montagem do Núcleo Ás de Paus (PR) é uma fábula alegórica que
conta a história de Tia Miséria, que espera poder reencontrar seu filho, Fome,
que sumiu no mundo. Tia Miséria, na companhia de seu cachorro Sem Nome, mendiga
para viver e a única coisa que possui é uma pereira que dá peras deliciosas,
mas que sofre com os ataques das crianças da localidade. Muito solidária Tia
Miséria ajuda um desconhecido, que faz milagres (ou feitiços) e em pagamento de
tão bondosa ajuda, oferece seus serviços; a mulher pede para rever seu filho,
mas sendo isso impossível, pede então que quem subisse na pereira dela, não
pudesse descer a não ser por uma ordem sua. Assim ela dá uma lição nos moleques. Tempos depois, a Morte vem busca-la; é claro que ela
não quer ir. Enquanto negociam a Morte, por artimanha da Tia Miséria, sobe na pereira e fica presa, sem poder cumprir sua
missão. Um grande caos se forma, porque as pessoas não podem morrer; o mundo sofre
porque não pode morrer. O Médico tenta ajudar a
Morte a se libertar, mas acaba preso também. Por fim, Tia Miséria liberta a
Morte com a promessa de que só será levada quando ela assim permitir, na
esperança de um dia rever seu filho. A lição final é que a Miséria só vai
morrer quando a Fome acabar sua peregrinação pelo mundo. Bela mensagem,
excelente tratamento técnico. O espetáculo é dramaturgicamente muito bem
construído, por Luan Valero, com uma música cênica muito boa assinada por Eric
D’Avila. Trabalhar o assunto da morte, miséria e fome para um público infantil
não é tarefa fácil e o grupo cumpre muito bem. As crianças captavam o que
conseguiam e o que não compreendiam do texto, assimilavam pela estética da
montagem. O nível técnico dos atores é muito bom, corporal e vocal, com
destaque para as músicas, todas cantadas por eles em cena, e o uso de pernas de
pau pela maioria dos personagens, elevando a ultima potência o esforço físico
em cena. O figurino servia de caracterização e prolongamento do corpo do ator;
muito bem concebido por Alex Lima. Essa é uma pesquisa do grupo que trabalha a
presença do ator calcando na pesquisa do prolongamento do corpo do ator na
cena; trabalham com pernas de pau, adereços expandidos, muletas, cajados, e da manipulação de bonecos. Além dos adereços, a
pesquisa do grupo demonstrou preocupação com aquele que é o prolongamento
básico do corpo de todo ator: a voz. Uma
técnica potente de voz falada e cantada, trabalhando uma música bonita e funcional.
O jogo dos atores em cena é muito bom, mas deixam transparecer, em um momento
ou outro, a juventude dos integrantes; a concentração ainda está na cena,
preocupados com o nível técnico e com a perfeição, e pouco trocam com a
plateia. Mas isso, é claro, não prejudica nem um pouco o espetáculo. O Núcleo
Ás de Paus aparece como uma grande promessa; podemos esperar para acompanhar o
desenvolvimento deste grupo que já traz indícios de um trabalho consistente e
engajado.
Continue acompanhando os
espetáculos do Palco Giratório, que termina dia 30 de maio!
Juliana Capilé e Tatiana Horevicht
CIA PESSOAL DE TEATRO