quarta-feira, 24 de junho de 2015

ODIN TEATRET - Holstebro - Dinamarca

Odin Teatret, Holstebro
Frio. Chuva. Apesar do clima instável e hostil, estamos no verão dinamarquês. Do lado de dentro, um calorzinho aconchegante das boas amizades. Todos são muito receptivos e amáveis; Odin Teatret é um "país" com fronteiras abertas para o mundo todo.
Com 50 anos de existência, este grupo iniciou suas atividades em Oslo, na Noruega, em 1964, a partir do desejo de seu diretor, Eugenio Barba, de se desenvolver na carreira de diretor de teatro. Depois de três anos como assistente de direção de Jerzy Grotowski, Eugenio Barba decide "treinar" como diretor amador para depois se tornar profissional, mas não é aceito em nenhum teatro profissional de Oslo. Consegue, então, a lista dos  candidatos reprovados no teste admissional da Escola de Teatro de Oslo e os convida para uma reunião de trabalho. Já que havia sido rejeitado como diretor, resolveu se unir aos que haviam sido rejeitados como atores; este foi o início do grupo que influenciou grande parte da criação cênica desenvolvida no Brasil (e em outras parte do mundo). Influenciou, especialmente, não por sua estética, mas por sua proposta cênica, que confrontou com o velho método teatral da escola clássica. Hoje, tentar entender essa influência é um exercício de imaginação, pois já incorporamos no nosso modo de fazer teatro todas essas "revoluções", mas nos anos 1960, fazer teatro significava, exclusivamente, fazer NO teatro;
com Julia Varley
um espetáculo só possuía um local de existência. Odin foi um desses grupos que buscaram experimentar o método de Stanislavski, colocando em prática boa parte das "teorias" existentes até então: Meyerhold, Copeau, Artaud, Gurawski, Grotowski, Apia, etc. Além disso buscou no oriente realizar o "caminho de volta" à procura do ritual que acompanhou o início da história do teatro, mas que se perdeu com o tempo. O contato com o oriente carregou não só a estética do teatro praticado pelo Odin Teatret, mas também interferiu na dinâmica do grupo,conferindo um peso às tradições e ao treinamento corporal e vocal diário para os atores.
com Eugenio Barba
O resultados dos encontros com outras culturas fez nascer uma tentativa de sistematizar o modo de olhar para outras tradições teatrais, dando origem ao termo "Antropologia Teatral", que serve para denominar o conjunto de compilamentos e formas de compreender uma cultura teatral e suas tradições, convertidas para uma linguagem cênica. Muitos foram os caminhos trilhados na busca de responder à uma pergunta: o que nos torna um ator? Não é algo realmente de fácil resposta: um músico pode ser denominado assim por causa de sua habilidade em tocar um instrumento, e um artista plástico se
com Else Marie Laudvik
percebe porque é capaz de reduzir uma realidade a uma dimensão pictórica, mas o que um ator precisa saber para que seja denominado ator?
O caminho para esta resposta foi longo e tortuoso, e assim é a história deste grupo. Cheia de altos e baixos, de muitas perdas e infinitos ganhos, e repleta de paixão por aquilo que faz. Os integrantes do Odin Teatret e todo staff conservam com muito zelo e profissionalismo a junção entre "fazer o que deve ser feito" e "gostar daquilo que se faz". Se não existe uma forma, basta criá-la. Os princípios que guiam o treinamento dos atores são os mesmos que norteiam o trabalho dos técnico, do pessoal da administração e staff em geral.
Um dos muitos jantares com o pessoal que vive na sede em Holstebro.
Estar em contato com essa história é inspirador e também inquietante. Somos um pequeno grupo de teatro que atua no interior do Brasil, mas carregamos a responsabilidade de dar continuidade a um teatro que se pretende transformador. No período histórico vivido pelo Odin Teatret, a necessidade era transformar o mundo em que viviam. Hoje, devemos transformar o ser humano que vive no mundo, mas seguir buscando transformar, quer seja a partir da estética, quer seja a partir da poética. Pensar em teatro de grupo hoje em dia, significa fazer parte de um coletivo de pessoas que pretendem buscar juntos um significado para aquilo que vivemos em nosso espaço/tempo.